sábado, 6 de junho de 2009

O MEDO NO OCEANO ( PARTE I )



Especial


Voo 447
O medo no oceano
Misterioso desaparecimento do voo 447, com 228 pessoas, quebra paradigmas da aviação

Adriana Prado, Gustavo de Almeida e Renata Cabral




Vive no oceano escuro, entre montanhas submarinas escondidas a mais de quatro mil metros de profundidade, a meio caminho entre o Brasil e a África, a soma de todos os medos de quem viaja de avião. Na noite do domingo 31 de maio, a calmaria encontrou a tempestade e, pela primeira vez em 73 anos, a máquina derrotou o homem nas nuvens do Atlântico Sul, acrescentando às curvas do desastre a dor de 228 famílias e um mistério que assombra quem precisa agora subir as escadas de um jato: por que o voo 447 da Air France, que saiu do Rio de Janeiro às 19h com destino a Paris, contrariou alguns dos principais paradigmas da aviação?

Em primeiro lugar, o Airbus 330 caiu em pleno percurso, fase do voo que responde por apenas 5% dos acidentes no mundo. Nunca um desastre semelhante havia acontecido na ligação entre a América do Sul e a Europa, a chamada Rota do Atlântico, utilizada por aproximadamente 100 voos semanais e sem nenhum registro de acidente desde 1936.

Segundo, pela ocorrência com uma grande aeronave, considerada de menor risco pela sofisticação dos recursos. O A330 entrou em operação em 2005, o que o coloca na condição de avião novo. E em 16 de abril tinha passado pela revisão anual obrigatória. No comando do AF447 estava um piloto experiente, com mais de 11 mil horas de voo, sendo 1.700 apenas no A330.

Mas, após quatro horas de uma viagem perfeita, bastaram menos de 15 minutos para que o avião saísse do chamado voo de cruzeiro - aquele momento em que, a altitude e velocidade constantes, os passageiros finalmente relaxam de todo o stress do aeroporto e do embarque e vão ver filmes, ler ou dormir - , entrasse numa tempestade, sofresse uma pane elétrica e se despressurizasse, desaparecendo nas profundezas do Atlântico a 820 quilômetros do arquipélago de Fernando de Noronha.

Por contrariar estatísticas, desempenho tecnológico e experiências anteriores, a queda do 447 pode entrar para a história como um dos maiores mistérios da aviação.



"Esse acidente traiu todos os elementos que consideramos para afirmar que um voo é seguro", diz Moacyr Duarte, pesquisador da coordenação dos programas de pós-graduação em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ). O governo francês reconhece a dificuldade de encontrar respostas para a queda do Airbus. "Existe a possibilidade de que nunca encontremos as caixas-pretas", disse Paul Louis Arslanian, diretor do Escritório de Investigação e Análise Francês (BEA), encarregado de tentar elucidar os casos de acidentes aéreos.

Sem as caixas-pretas, a missão da BEA fica mais difícil, mas não impossível. O Airbus era dotado de um sistema chamado de Acars (sigla em inglês para sistema de comunicação e informação da aeronave), que comunica imediatamente à empresa aérea qualquer erro detectado pelos computadores. Sua função principal é avisar às equipes de manutenção sobre um eventual defeito na aeronave, permitindo o reparo imediato no pouso. Foi este sistema que emitiu a sequência de alertas indicando velocidades contraditórias, pane elétrica e despressurização.

Enquanto os investigadores franceses se preocupam em recolher o máximo de dados e em considerar todas as possibilidades, a ponto de não descartar nem mesmo a hipótese de um atentado terrorista, como frisou, na sexta-feira 5, o ministro da Defesa, Hervé Morin, os mistérios do desaparecimento trouxeram uma certeza: está disseminado o chamado medo de voar.

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