sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

CENSURA AO "JORNAL ESTADÃO" - UMA VERGONHA PARA A LIBERDADE DA IMPRENSA NO BRASIL

Revista ÉpocaÉPOCA – Paulo Moreira Leite

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Ataque à liberdade

sex, 11/12/09por Paulo Moreira Leite |categoria Geral| tags Censura, Liberdade, STF
Confesso que a decisão do STF que manteve a censura ao Estado de S. Paulo é um episódio preocupante e constrangedor. Já escrevi sobre isso mas acho necesssário voltar ao assunto.

Não há desculpa: a Constituição proibe a censura.

Ao alcance de qualquer criança, a TV à cabo exibe filmes pornográficos.

Um militante pode escrever que o presidente da República tentou estuprar um companheiro de cadeia.

O governador de Brasília é exibido pela TV recebendo dinheiro em pacotes.

Muitas pessoas podem se dizer ofendidas por um ou vários episódios acima. Podem alegar que foram invadidos em sua privacidade ou que sua honra está sendo exposta em praça pública — sem direito a defesa. Mas eu acho que liberdade é isso. Inclui inclusive o direito de dizer besteira.

Vamos ver o caso do Estadão. A partir de julho o jornal foi proibido de publicar reportagens sobre Fernando Sarney, o filho do presidente do Senado José Sarney. Essas reportagens tinham como base investigações da Polícia Federal. Fernando Sarney sempre foi procurado para oferecer sua versão sobre os fatos.

Sou contra aqueles pessoas que querem dirigir o trabalho da imprensa e dizer que ela deve ocupar-se de assunto de interesse público. Acho que a imprensa é livre para tratar dos assuntos que quiser, como quiser — e arcar com as consequencias. Vivemos num país de cidadãos livres para decidir e escolher.

Mas mesmo desse ponto de vista, do interesse público, as reportagens do Estado são impecáveis. Não envolvem a vida privada do filho do presidente nem seus familiares.

Um leitor sugere uma contabilidade: aliado de Sarney, Lula nomeou a maioria dos juizes do Supremo, os juizes votaram pela censura, logo…

Os números são mesmo ruins para os juizes que Lula nomeou. Quatro dos seis votos a favor da Censura foram nomeados por Lula.

(Os outros dois foram nomeados por FHC).

São dados que exigem uma reflexão em vários níveis. Mas é preocupante notar que ocorreu uma investida contra a liberdade de expressão — e que ela partiu daquele órgão que deveria ser o primeiro a defendê-la.

A censura continua

qui, 10/12/09por Paulo Moreira Leite |categoria Geral
Sou o primeiro a admitir minha ignorância absoluta para altas discussões jurídicas. Mas confesso que tenho dificuldade para entender a decisão do STF, que manteve a censura ao Estado de S. Paulo, que desde julho foi proibido de publicar reportagens sobre as empresas de Fernando Sarney. Não foi uma decisão sobre mérito, isto é: ao menos em teoria, ninguém votou a favor da censura. Foi uma decisão sobre o procedimento: considerou-se que o jornal usou um instrumento errado para tentar acabar com a censura. O placar foi de 6 votos a 3.

Não entendo de direito mas entendo de política. Nas assembléias estudantis aprendi que as célebres questões de encaminhamento são uma forma astuta de construir alianças entre forças adversárias que raramente se entendem sobre questões fundamentais.

A maioria de hoje uniu os juizes considerados conservadoras com uma fatia de magistrados que são chamados de progressistas em função de votações e pronunciamentos públicos. Alegando questões de procedimento, os dois lados puderam dar-se as mãos e somar os votos para fazer maioria.

Pela decisão do STF, o caso irá a julgamento no Maranhão, terra natal de Fernando Sarney, onde sua família tem um reconhecido poder de mando e influência sobre todas as esferas do Estado.

Principal representante da minoria, o ministro Celso Mello proferiu um voto que é uma aula de história e de liberdade. Não perdeu-se nas questões de encaminhamento e foi ao principal: a liberdade de expressão é um dos direitos fundamentais do país e deve prevalecer sobre outros direitos.

O ministro lembrou o regime militar e recordou que a censura chegou ao país pelo sistema colonial. Falou da tortura e até lembrou de vários filmes que foi proibido de assistir porque um general que dirigia a Policia Federal de São Paulo não gostava do que exibiam.

Celso Mello até citou uma decisão recente do STF, que, em nome da liberdade de expressão, repudiu todo esforço para censurar a programação infantil. Sem perder o humor, o ministro fez questão de registrar que, na votação de hoje, debatia-se a censura a fatos que não tem nada a ver com o universo infantil.

A argumentação foi tão clara e coerente que levou dois ministros do campo contrário a pedir a palavra para dar explicações adicionais. Um deles chegou a recordar seu passado de perseguido político.

A censura envergonha o país, qualquer que seja o argumento empregado para mantê-la. O STF teve uma chance de restaurar uma liberdade e desperdiçou essa oportunidade.

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