sábado, 20 de fevereiro de 2010

UM ESTADO GOVERNADO POR BANDIDOS QUE NÃO PRECISARIA EXISTIR

Economia

Um governo ausente e caro demais
Mergulhado na lama, o Distrito Federal, que custa ao País R$ 22,5 bilhões ao ano, já não tem mais comando. E muitos defendem até o fim de sua autonomia administrativa

Guilherme Queiroz

Na quinta-feira 18, Brasília inteira esperava ouvir do governador interino do Distrito Federal, o empresário Paulo Octávio, homem mais rico da cidade, o comunicado de sua renúncia ao cargo. Mas o que se viu do púlpito, no salão principal do Palácio Buriti, foi um envergonhado anúncio de que ele continuará - embora não se saiba por quanto tempo. "Não posso renunciar da obrigação de servir a Brasília e a seu povo", disse Paulo Octávio. Ao mesmo tempo, ele afirmou que tem uma carta de renúncia já escrita. Foi um movimento inédito na história política brasileira - na prática, Paulo Octávio renunciou à própria renúncia. Mas o que ficou evidente é que Brasília não tem mais comando. A capital federal convive hoje com um governo não apenas fraco e ausente, mas também caro demais. O GDF custa R$ 22,5 bilhões ao ano. Medido em termos per capita, o orçamento do Distrito Federal, de R$ 8,6 mil por habitante, é, disparado, o maior do País e quase três vezes superior ao de Estados como São Paulo e Minas Gerais.



Tanto dinheiro e tanta corrupção serviram para reacender um debate antigo e polêmico: Brasília deve manter o direito de se autogovernar, independente administrativa e financeiramente da União - apesar de receber dela um terço do seu orçamento? Ou seria melhor dar autonomia às cidadessatélites para que elas elegessem seus prefeitos? Para o arquiteto Carlos Magalhães, que está na cidade desde a construção da nova capital e ocupou cargos importantes em várias administrações, a melhor solução seria a gestão federal do Plano Piloto, onde estão os ministérios e prédios públicos, e a autonomia das cidades-satélites, com prefeitos eleitos pela população. Ele defende a tese desde o início da década de 1990, quando já percebia sinais das distorções que permanecem até hoje.

"Brasília é grande demais para ser sustentada por outros Estados e pequena demais para se sustentar", argumenta.

Apesar da maior renda per capita do País e de um orçamento por habitante quase três vezes superior ao de São Paulo, a população da capital não recebe os benefícios equivalentes ao polpudo volume de recursos administrado pelos governantes. O índice de desenvolvimento humano é elevado no Plano Piloto - 0,94, o equivalente ao do Reino Unido -, mas em algumas cidades-satélites, como Ceilândia, com meio milhão de habitantes, é de 0,78, semelhante ao do Paraguai. As desigualdades são facilitadas pelo atual modelo político, que prevê a eleição de um governador pelos 2,6 milhões de habitantes do Distrito Federal. Que por sua vez tem autonomia para nomear os administradores das 23 cidades-satélites, algumas delas com população maior do que a do Plano Piloto. Taguatinga, Samambaia e Ceilândia têm, juntas, quase metade da população do Distrito Federal.

Além da centralização da administração, Brasília também se beneficia do Fundo Constitucional, uma conta financiada pelo contribuinte que remunera Brasília pelo ônus de sediar a capital federal e as representações diplomáticas. Para este ano, estão previstos R$ 7,6 bilhões em repasses do fundo para custear a saúde, a educação e a segurança pública locais, o equivalente à metade do orçamento próprio. Livre de arcar com os segmentos mais onerosos da administração pública, o governo local tem folga extra para destinar partes de seu orçamento às obras de grande vulto típicas das últimas gestões - muitas delas com suspeita de irregularidades. A lei atribui também à União a responsabilidade de arcar com a Justiça do Distrito Federal e com o Ministério Público, despesas que os demais Estados têm de bancar com recursos próprios. Em 2010, os órgãos custarão R$ 1,9 bilhão.

Paulo Octávio: o vice-governador renunciou à própria renúncia, cuja carta já havia até sido redigida

Há mais de duas décadas, a discussão sobre a autonomia do Distrito Federal divide opiniões e motiva soluções voluntariosas. A mais conhecida delas, de 2002, surgiu num projeto apresentado ao Senado, que prevê a criação do Estado do Planalto Central, composto pelas cidades-satélites. O Plano Piloto, por sua vez, ficaria sob gestão do governo federal, mas a proposta nunca avançou na Casa. Surpreendentemente, também teve pouco apoio popular uma proposta do deputado federal Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) para que todas as cidades-satélites elegessem seus prefeitos. "Há opiniões para todos os gostos. Mas haverá muita resistência das classes políticas locais contra qualquer mudança", analisa o cientista político Leonardo Barreto. Defensor do modelo atual, ele considera que uma perda da autonomia alijaria os brasilienses de suas instituições democráticas. Mas lá o fato é que elas não têm funcionado

Nenhum comentário:

Postar um comentário