sábado, 23 de maio de 2009

ELES ESTÃO NO PARAÍSO - ISTO É DINHEIRO - PÁG. 02

Eles estão no paraíso
As maiores multinacionais do mundo veem no Brasil uma oportunidade de driblar a crise e obter aqui os lucros que que não conseguem lá fora

Por Amauri Segalla e Hugo Cilo

"A Lego vive seu melhor momento no Brasil desde que chegou ao País, em 1986"

ROBÉRIO ESTEVES
Presidente da dinamarquesa Lego no Brasil

As vendas cresceram 15% graças à estratégia de explorar novos nichos e pela conquista de consumidores que subiram para a classe C.
Os balanços do primeiro trimestre divulgados nas últimas semanas são um retrato fiel do fôlego da economia brasileira. Talvez o caso mais emblemático seja o da Nivea, uma das maiores fabricantes mundiais de cosméticos e produtos de beleza. As vendas da empresa no Brasil cresceram 17,4% nos três primeiros meses do ano. Mundialmente, o faturamento do grupo alemão caiu 0,5%. Na Europa, a performance foi desastrosa (queda de 7,2%). Nem a China, emergente que hoje em dia funciona como parâmetro de comparação com o Brasil, repetiu o desempenho dos brasileiros (os chineses aumentaram suas vendas em 12,2%). Nicolas Fischer, um tímido alemão que está no comando da subsidiária brasileira desde o início de 2006, conseguiu algo impensável até pouco tempo atrás. A Nivea do Brasil teve no começo de 2009 o melhor resultado entre os 150 países em que a empresa atua. Fosse uma corrida de obstáculos, ele teria deixado para trás campeões como os americanos, os alemães, os franceses, os japoneses, os italianos, qualquer um. "O Brasil é uma surpresa para o mundo", diz Fischer, ainda carregando no sotaque alemão. "O mercado europeu e o americano estão saturados, não vão oferecer muito mais. Para muita gente, a China, a Índia e a Rússia são uma incógnita. O Brasil já é uma certeza." É óbvio que o crescimento da Nivea no Brasil está ligado também a novas estratégias adotadas recentemente pela empresa, como o lançamento de produtos para a classe C e para o público masculino, para ficar só em dois exemplos. Mas ele reconhece que uma fatia grande do sucesso se deve ao grau de desenvolvimento da economia do Brasil. Os indicadores não mentem. Segundo os últimos dados do IBGE, as empresas voltaram a contratar. A indústria paulista, a mais forte do País, aumentou sua produção nos últimos meses. O dólar, que chegou a bater R$ 2,50 no auge da crise, está próximo da confortável casa dos R$ 2. Se no Exterior as grandes economias projetam quedas brutais no PIB, o governo estima uma alta de pelo menos 1% na riqueza nacional em 2009. Se forem considerados dados de 2008, é covardia comparar o Brasil com as nações mais ricas - os brasileiros têm performance melhor na maioria dos indicadores econômicos. "No Brasil, o potencial de crescimento da classe consumidora, o espaço para ampliação do crédito e o amadurecimento do mercado criam o ambiente perfeito para a expansão das multinacionais", diz José Reynaldo Sampaio, economista e professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA). Sampaio vai direto ao ponto. "As multinacionais querem novos clientes? O Brasil tem. Estão atrás de custos baixos? O Brasil oferece. Visam retorno rápido e segurança para os investimentos de longo prazo? O Brasil permite tudo isso." Professor da Unicamp, o economista Julio Gomes de Almeida acrescenta um novo ingrediente. "As multinacionais estão bem no Brasil porque os ajustes feitos em razão da crise não foram suficientes para estrangular as margens de lucro", afirma.

"Em receita, o Brasil está atrás só da França. Estamos em 130 países, mas o mercado brasileiro é prioridade"

MARCOS DE MARCHI
Presidente da Rhodia na América Latina

A companhia francesa, uma das maiores empresas químicas do mundo, está completando 90 anos de atuação no País com a melhor perfomance da história.
Um relatório divulgado na semana passada pela Agência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (Unctad) confirma o apetite dos estrangeiros pelo Brasil. Segundo o estudo, em 2008 a entrada de investimentos estrangeiros diretos no País cresceu 30% ante 2007. Detalhe: a movimentação de recursos externos caiu 15% no mundo. Na Alemanha, a queda foi de 55,8%. Na Itália, de impressionantes 66,9%. A China, que durante muito tempo foi imbatível na captação de recursos estrangeiros, viu o dinheiro vindo do Exterior aumentar apenas 5%. A francesa Rhodia, uma das maiores indústrias químicas do mundo, vai injetar US$ 50 milhões em suas fábricas no País. A operação brasileira vem ganhando espaço no faturamento global da companhia. No ano passado, o País respondeu por 15% dos 4,8 bilhões de euros de receitas mundiais da Rhodia - é o maior percentual já alcançado pela subsidiária. "Em receita, o Brasil está atrás só da matriz, na França", diz Marcos De Marchi, presidente da Rhodia na América Latina. "Estamos em mais de 130 países, mas o mercado brasileiro é prioridade. Ainda mais neste momento em que o mundo encolhe."

A percepção de que o País vem consolidando uma posição de destaque no tabuleiro dos investimentos está próxima do consenso. Para o presidente da multinacional alemã de automação comercial Festo, Waldomiro Modena, a posição de "relativo conforto" do País tem seduzido o mundo e, no caso do setor em que ele atua, está à frente até da China, a grande estrela mundial. "Do ponto de vista tecnológico, não perdemos nada para as nações ricas. Isso é fruto de grandes investimentos e nos deixa em melhores condições de competir", afirma o executivo. O vicepresidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Alfried Plogger, prevê uma nova onda de investimentos no Brasil, assim que a crise tiver sido melhor digerida pelas grandes economias. Segundo ele, o setor industrial reagirá nos próximos meses para repor os estoques que foram "queimados" no início do ano e para suprir o consumo, que não recuou como se imaginava. "Além daqueles recursos que estão chegando, há muitos investimentos em andamento desde o ano passado." Plogger defende a ideia de o Brasil se tornou uma ilha no mundo. "Estamos em situação diferenciada", diz. "Os países ricos enfrentam retração e os vizinhos, Argentina e Peru, estão no sufoco."



PÁGINAS :: << Anterior | 1 | 2 | 3 | Próxima >>

Nenhum comentário:

Postar um comentário